02/06/23

(In)Certezas



(…)
Talvez! Que certezas?
Certezas, sim… que nos encontramos, que cimentamos uma relação de amizade duradoira para a eternidade numa porção de espaço temporal. Pequena… mas terrivelmente acolhedora, incomodativa. Desejo a tua presença, porque te sinto quando estás perto e longe, mesmo quando não te vejo. 
Imagino-te algures por aí inesperadamente perdido por ti, e por mim. Enquanto não estás, parece que nada existe, apenas as paredes deste quarto solitário dispersamente decorado e com a cama ainda desfeita da última vez que tivemos juntos. 
Não me deixas ter sono, parece um sufoco, respiração acelerada. Sinto-te… Não é sonho. É real. Desenrola-se diante dos meus olhos, vejo o teu olhar penetrante sequioso de desejos, de abraços, de beijos suaves e molhados. São muitos momentos vividos em êxtase, para não ignorar. Importantes, para mim e para ti, mesmo tendo-te ausente do meu horizonte, mas não do meu pensamento. É amor? É amor? Será amor? Paixão descontrolada? Que melancolia me assalta o corpo nesta cama onde ainda sinto nos lençóis o suor da tua última passagem. Fico arrepiado quando agarro o travesseiro. Só de pensar em nós os dois…aqui vivendo o amor da eternidade… Neste momento transbordam as emoções, os soluços, as lágrimas perdidas…
Porquê eu? Eu? Sim eu? E porquê tu? Sim tu… Diz-me porquê, onde quer que estejas… Não precisas! Lembro agora na recordação, que os teus olhos castanhos quando me olhavam fixamente quando fazia-mos amor, podia visualizar que irias ser meu para sempre. Eles brilhavam quando dizia que te amava. Mas, certezas não existem, só o amanhã traz certezas avulsas das incertezas que passamos, são inseguranças provocadas pelo medo de falhar. Todos nós temos recaídas, como o tempo. Sempre o tempo… Só os factos nos podem consolar, são as certezas daquilo que vivemos na intensidade dos sentimentos. Para além disso construímos ideias mágicas que nos acompanham na direção dos encantos felizes e infindáveis. Mais nada me move, apenas tu meu amor. Deixei-te invadir o território da minha intimidade e da minha existência. Só tu o conseguiste, só tu foste portador da chave do verdadeiro amor. Olho para a janela, aqui deitado nesta cama desalinhada, esperando que espreites e me faças um aceno, como era teu hábito quando regressavas a casa. Sabias que eu estava ali todo para ti, para a tua amizade, de amante, de companheiro. 
Vejo rosas vermelhas, oh que me faz recordar tantos momentos. Lembro aquelo dia na semana passada que espalhei as pétalas em cima da cama rodeada de velas numa noite de inverno em que tu regressavas de uma ausência profissional. Que noite essa, inesquecível, das melhores, de todas, bastava estares presente junto a mim. Sentia segurança, agora sinto insegurança, estou perdido, sonhando que a qualquer momento entres pela porta de mansinho num dos momentos em que eu possa estar a dormir, se conseguir… Escrevo estas palavras, meros desabafos, para o caso de eu desfalecer, morrer até, tu possas ler e deliciar-te com as minhas últimas palavras. Que todas as musas do Universo possam ouvir as minhas súplicas, que possas voltar, antes de imprimir as minhas ultimas palavras nesta folha de papel do teu diário que aqui deixaste esquecido. O teu diário! Sim, o teu diário ficou, prenúncio que vais voltar… é demasiado valioso para o teres deixado para trás. Tantas lágrimas desprendidas, quando se descortina agora no fundo do túnel uma luz brilhando, mesmo que ténue. Será a  tua aproximação? Com certeza que já estou tendo visões, será que estou louco? Pego no teu diário, passo-o demoradamente pelo meu corpo, sinto o teu respirar ofegante, a tua delicadeza, do orgasmo infindável das tuas parcas palavras enquanto o corpo fazia o resto…
Adormeci e acordei quando o Sol já me entrava pela janela, os seus raios acariciavam-me a face e o peito. Olhei para o lado, estava apenas o travesseiro vazio com o diário. Na cadeira, junto à janela estava o blusão que te oferecera. Dei um salto na cama! Caí no vazio do tempo. 
(…)

Adaptado de um original escrito em 1993




(em atualização)

Sem comentários: