“O olhar de um
rebelde, que nos prova ser ainda possível inventar ou pelo menos reinventar o
cinema” “O resultado é uma saga fascinante sobre o (im)possível regresso à
natureza, com um excelente Emile Hirsch no papel principal” - João Antunes, Jornal de Notícias.
Com o título original “Into
The Wild” foi escrito e realizado por Sean Penn, com os actores principais: Emile
Hirsch, Marcia Gay Harden, William Hurt.
O Lado Selvagem é
inspirado numa história verídica de Christopher McCandless (Emile Hirsch), um
jovem que abandona a sua vida de conforto para procurar a liberdade total na
estrada, uma viagem que o leva até ao lado selvagem do Alasca e ao seu maior
desafio.
O Lado Selvagem retracta
na primeira pessoa a vida de Christopher
McCandless protagonizada brilhantemente pelo actor Emile Hirsch. Com 22 anos de
idade e com o curso universitário terminado, resolve deixar os privilégios
socias de pertencer a uma família com poder económico e de prestígio social, e
ir à aventura em busca de si próprio. Este filme é uma viagem ao mais recôndito
que a natureza humana têm, o voltar à natureza que o tem afastado através da
evolução humana. Transforma-se para nós que vivemos no pseudo conforto da
sociedade ocidental, num vagabundo que não se identifica com os padrões que a
sociedade tomou. Com a experiência dessa aventura ele descobre as suas
capacidades, ultrapassando obstáculos e conhecendo pessoas que vivem nos
confins da outra realidade americana ou toda aquela que está fora das grandes metrópoles.
Nesses locais ainda é possível conhecer gente honesta sem qualquer tipo de
interesses, e onde prevalece a amizade. Ser vagabundo acaba por ser também uma
opção emotiva para muitos que ambicionam liberdade, mas que são incapazes de
sair do seu casulo cómodo.
O Lado Selvagem começa
com uma citação poética de Lord Byron:
Há um prazer nas florestas desconhecidas;
Um entusiasmo na costa solitária;
Uma sociedade onde ninguém penetra;
Pelo mar profundo e música em seu rugir;
Amo não menos o homem, mas mais a natureza.
Esta entrada é sobretudo
um aviso à navegação dos espectadores, preparando-os para o que se vai
desenrolar na tela. Como todos os filmes, é um filme para pessoas que pensam, mas que
pensam mesmo pela sua cabeça e não pela das outros. Porventura outros não
encontrarão mais nada senão um delírio de um estudante que só teria era que
aproveitar a vida que tinha pela frente. Nada mais egoísta para assim pensar,
mas, cada um tem o seu livre arbítrio, e pode efetuar as escolhas que acha que
lhe são úteis, desde que não prejudique todos os outros, o que não acontece na
grande maioria dos casos. A ditadura das maiorias perante as minorias é uma
farsa social que só comtempla mesmo os farsolas ditadores. A vida, tal como a
conhecemos é uma mentira, bem evidente e salientada pelo protagonista principal
e aventureiro. Diz ele não preciso de dinheiro,
torna as pessoas cautelosas. O dinheiro é sem dúvida uma das monumentais
invenções humanas, que como tudo na vida tem o seu lado bom e o lado mau. Sendo
que a meu ver o lado mau é muito superior. Torna as pessoas escravas da vida e
dos interesses económicos e financeiros de um país. Christopher McCandless,
cita Thoreau, “mais do que o amor, do que
o dinheiro, do que a fé, do que a fama, do que a justiça, dêem-me verdade”.
E daí ele referir que vivemos uma vida com base na mentira. Algumas pessoas julgam que não merecem amor.
Retiram-se silenciosamente para espaços vazios, tentando fechar, a comunicação
com o passado. Sublime esta passagem, testemunha desta situação na primeira
pessoa e de outras pessoas, muitas vezes é um recurso adjacente para não ferir
ninguém, quando a maioria de nós se fere nesse refúgio. Às vezes é necessário
romper com situações nefastas. Christopher McCandless, viveu toda a sua adolescência
no seio de uma família em que o pai e mãe viviam numa relação de violência doméstica,
na maioria das vezes presenciada pelo Christopher e pela irmã. Tantas relações
destas que temos por aí que dizimam a intelectualidade de cada um, destrói afetos,
abre caminhos destrutivos para uns, alternativas vãs para outros, com sequelas
pela vida fora. As únicas oferendas do
mar são duros golpes, e a oportunidade ocasional para nos sentirmos fortes, não
sei muito sobre o mar, mas sei que aqui é assim. E também sei, que na vida, o
mais importante não é necessariamente sermos fortes, mas sentirmo-nos fortes. Colocarmo-nos,
pelo menos uma vez, nas maiores condições humanas. Enfrentar sozinhos a rocha
cega e surda sem outra ajuda que não a das nossas mãos e cérebro. O mais
importante não é sermos fortes, mas sentirmo-nos fortes. É um facto a
ambivalência desta observação, reveladora que num mesmo patamar de reflexão
podemos ver dois horizontes distintos, em que um deles de facto, é a porta
aberta para prosseguir e descobrir conhecimento. Na vida, nesta vida era útil
que cada um despertasse por si mesmo e não pelas cartilhas instituídas pelo
poder de condução do rebanho, em que todos nós somos as ovelhas desse mesmo
rebanho. Se alguma delas se revoltar será abatida no imediato, sendo que todas
as outras serão abatidas quando forem substituídas pelas novas crias. É assim
que que se vive e vivemos neste inferno de vida. Sociedade!!! Porque saber o que não entendo? Não entendo porque raio as
pessoas são tão más umas para as outras tantas vezes. Não faz sentido, para mim.
Julgam os outros. Controlam. Tudo isso, o leque todo. De que pessoas estamos a
falar? Pais, hipócritas, políticos, cretinos. Esta passagem de diálogo é o
reflexo da vivência do protagonista no seio de uma família e sociedade que vive
no faz de conta e se está a marimbar para os excluídos ou os que são
diferentes. Conduzem as suas vidas para que os outros os possam apontar com
aparentes exemplos mascarados de virtude. Se
admitirmos que a vida humana pode ser regida pela lógica, a própria
possibilidade de vida é destruída. É revelador que esta passagem com
conteúdo filosófico admirável, o que não é esta vida senão uma lógica
materializada num gabinete de quatro paredes onde se germina a orientação de
uma sociedade, sem a intervenção das pessoas? Ou esquecem-se que somos todos potenciais
criadores do futuro? Com certeza que muita coisa mudaria. Somos todos
protagonistas na vida para a vida, porque razão temos que ser excluídos da e na
nossa vida? O Lado Selvagem é um murro no estômago para os que estão cientes na
inércia e da lógica desta sociedade cheia de estereotípicos, mas não encontra
espaço em gente insensível habituados a viver no meio de aparências e da mentira.
São umas marionetas, que despidas, nada sobra, nem para alimentar uma fogueira
pelos perigos de contaminação. E quando
se pensa mais do que se quer, os pensamentos sangram. Diria, também que
incomodam quando os libertamos, mas às vezes os resultados ficam por conta do
chamado papel dos mártires, normalmente só reconhecidos por gente que nasce
noutro século. …mas sim pessoas amaciadas
pela reflexão forçada que a dor trás. A dor e Deus são assuntos abordados
com grande intensidade em O Lado Selvagem, acompanhada de uma excelente banda
sonora que nos cala e incomoda no silêncio das imagens. Quando queres alguma coisa ma vida, tens que a agarrar…
Necessariamente todos nós deveríamos se culturalmente educados e formados nesta
simbiose do esforço individual à procura das suas capacidades inatas.
Observamos à nossa volta e verifico que isto não passa de uma ideia utópica ou
quanto muito ser classificada demente. O Lado Selvagem, para além de ser um
desafio aos obstáculos da vida, é também um hino aos afetos, aos verdeiros
afetos sem interesse, puros, daqueles que vão escasseando com a cada vez maior
materialização da sociedade. Também evoca silêncios, muitos silêncios, quando
muda a tela ainda o nosso pensamento está a processar a anterior. O filme é
sobre pessoas para pessoas. As carreiras
são uma invenção do Seculo XX. Christopher McCandless, o disse na primeira
pessoa. Aluno com médias de 20 valores seria um brilhante catedrático a
engrossar com certeza alguma elite que faria dele um instrumento de manobra científica,
económica, etc. Os excluídos, aqueles que não passaram dos primeiros anos
escolares, serão classificados de marginais, os que embrutecem pelo trabalho
escravo, que vivem no seio do alcoolismo ou da prostituição. Devia mudar radicalmente o seu estilo de
vida! A essência do espírito humano vêm de experiências novas. Esta passagem,
nada tem de subjetiva. Bastante efetiva, porque disso posso falar à vontade.
Esse é chão que conheço muito bem. Considero-me um aventureiro teórico incapaz
de sair do lugar onde me encontro com a urgência de respirar outros ares.
Quando o fiz, senti isso mesmo, observar vivências novas, das poucas vezes que
saí de Portugal, com idas ao Brasil, Marrocos e Açores. Todos nós necessitamos
de vivenciar outras vidas, outras realidades, experienciar outras fronteiras. …se pensa que a felicidade na vida provém
principalmente das relações humanas, Deus colocou-nos a toda a volta. Está em
tudo. Tudo o que pudermos experimentar. As pessoas só precisam de mudar a forma
como veem essas coisas. A espiritualidade também está neste filme, embora
abordada de forma ténue. Basta um ou outro diálogo para que ele seja
contextualizado no filme todo. É um facto que não só as pessoas fazem parte da
equação, mas também tudo o que está à nossa volta, o mar, a floresta, o ar, os
outros animais. São agentes vivos e essenciais que fazem o Planeta girar neste
universo, embora a maioria dos humanos nem disso tem consciência, de tão
absorvidos que andam com as suas “coisinhas” de vida. Nem sequer entendem a
grandiosidade de tudo o que nos cerca, e que deveria merecer muito mais
respeito, como é o caso das alterações climatéricas por via de comportamentos
nefastos do homem. Quando se perdoa,
está-se a amar. E quando se ama a luz de Deus brilha sobre nós. Esta passagem vinda de um diálogo sobre a família
do protagonista, é sintomático. Parece aquelas coisas de novelas ou de brejeirices
populares. Mas o que faz a guerra? É a falta de amor. Não é preciso arranjar
outro tipo de desculpas. Todos erramos na vida, todos temos que ter
oportunidade de erguer, de descobrir a sua própria natureza sem estar
condicionada a reprovação social. Às vezes existem aqueles dias “que se foda
tudo”, quando se está desesperado. Ser vagabundo é notoriamente uma boa
alternativa à selva das sociedades. Em O Lado Selvagem, esse aspecto está muito
bem explorado, com a vida de miséria nas grandes metrópoles até ao simples
roupa de etiqueta num emprego para ganhar uns trocos para alimentar a aventura
de ir para o Alasca. Todos nós somos protagonistas da nossa própria história,
ela fica inscrita na biblioteca do tempo, é o testemunho das diversas passagens
que temos em várias vidas. Pelo menos assim considero porque acredito na
encarnação. É demasiado evidente para não ignorar. A felicidade só é real quando partilhada. A felicidade que tantos
falam, é hipoteticamente enganadora, alimentada artificialmente por símbolos criados
de forma ilusória. Ser feliz, é ser genuíno, ser verdadeiro, viver a pureza dos
sentimentos. O resto é paisagem para consumo de prazeres. Sou feliz enquanto te
estou a “foder”, e depois descarta-se e vai-se buscar outro quantum de
felicidade à esquina de prostíbulo. As coisas estão completamente
descaracterizadas, e daí tanto problema que está à nossa volta que é um sufoco.
O Lado Selvagem, é um
filme excitante de reflexões, de conclusões. Mas o protagonista Christopher McCandless, morreu no final do
filme. Deixou o legado escrito nos seus diários. Dou-me a pensar se continuasse
vivo o que teria sido? Casado com uma rapariga que conheceu e que ficou à espera
dele um dia?… Mas morreu, ficou a sua história, que se vai perdendo no tempo,
que ficou materializada neste filme. Afinal o mundo continua exatamente na
mesma como ele o deixou. Com os mesmos problemas. O mundo continua uma
autêntica aberração. O Homem não se tem entendido com a Natureza e a Natureza
vai dando respostas ao homem. E mesmo assim continua burro sem desprimor aos
burros.
Nota: O texto em
itálico, foi retirado dos diálogos do filme.
Texto inspirado ao som
de Shanty Deeep.
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