30/11/22

Nomadland - Sobreviver na América

 


Depois de décadas a trabalhar numa empresa de materiais de construção, Fern, de 60 anos, é despedida. Sem nada que a prenda à pequena cidade do Nevada onde sempre viveu com o seu falecido marido, resolve vender todas as suas posses e fazer-se à estrada. Ao longo do caminho, vai-se cruzando com nómadas como ela, que lhe ensinam várias técnicas de sobrevivência e cuja amizade e generosidade vai alterar a sua forma de olhar o mundo.
Com Frances McDormand como protagonista, um filme dramático escrito e realizado pela chinesa Chloé Zhao (“The Rider” e “Songs My Brothers Taught Me”), que tem por base “Nomadland: Surviving America in the Twenty-First Century” (2017), um livro autobiográfico onde Jessica Bruder conta a sua história. McDormand contracena com o actor David Strathair e também com Linda May, Swankie e Bob Wells, três nómadas na vida real que se representam a si mesmos. Vencedor do Leão de Ouro no Festival de Cinema de Veneza e do Prémio do Público do Festival Internacional de Cinema de Toronto (TIFF), recebeu também os Globos de Ouro de melhor filme dramático e melhor Realização, fazendo de Chloé Zhao a segunda realizadora a ganhar este prémio (a primeira foi Barbra Streisand, em 1984, por “Yentl”). Foi o grande vencedor do Critics Choice Awards, ao arrecadar quatro prémios: melhor filme, realizador, argumento adaptado e fotografia (Joshua James Richards). Nos Óscares, foi premiado nas categorias de melhor filme, realizador e actriz principal (McDormand). 

Fonte: Jornal PÚBLICO (Portugal)



Apreciação
Nomadland - Sobreviver na América, é o primeiro filme que vejo numa sala de cinema em 2021. É um filme soberbo, com uma banda sonora de excelência. O filme é uma história de pessoas para pessoas. Pode-se até pensar que é uma história de velhos para velhos. Uma coisa é certa, quase todos lá chegaremos. Esta é também uma história da América para o mundo refletir e muito. Pode tocar-nos a todos. Nada nesta vida pode ser dado como adquirido. Nada sabemos o que nos pode acontecer no amanhã.
Dou-me a pensar que este filme é mais tipo documentário de uma história de vida na primeira pessoa numa América cheia de abismos existenciais. É uma história de nómadas de caravanas que poisam aqui e acolá temporariamente sobrevivendo com os meios que possuem. Retrata preto no branco a dura realidade de quem viaja pelo Oeste dos Estados Unidos e vive de empregos temporários mal pagos e faz disso a única fonte de rendimento. É um filme que faz do tempo uma plataforma de encontros e desencontros, de poeira, de céus estrelados e de fogueiras comunitárias onde se exorciza todos aqueles que já partiram.  Aqui confia-se simplesmente no tempo, não existem planos de vida. Cada dia é para ser vivido e/ou partilhado com o vizinho da caravana ao lado. Aqui o amor tal como o conhecemos parece estranho, pelo menos apresenta-se de uma forma pouco convencional. É um filme de silêncios, de imagens longínquas, distantes, gélidas, quase sempre sombreadas, como se a velhice seja isso mesmo, uma sombra negra do que está para vir. É um filme onde a tristeza se sente, que incomoda. É um filme que nos faz pensar na nossa existência, para que servirá os nossos sacrifícios.  É um filme em que a fraternidade, a partilha e troca de bens nos comove.  É um filme de liberdade e de anti-sistema, de contra normas sociais.  É um filme de sobrevivência, onde estamos quase todos nas mãos de grandes multinacionais que exploram ao seu belo prazer os trabalhadores, fazendo deles puros escravos em troca de uns miseráveis dólares. Mas na América deste filme os dramas da sociedade são a normalidade de uma anormalidade de uma América que olha para o seu umbigo e coloca o lixo social para debaixo do tapete. 
Excelente filme com uma representação de excelência, premiada pelas circunstâncias. Resta saber se esta América representada no filme alguma vez mudará, pelo menos nas próximas décadas.  

João Eduardo

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